Motta surpreende governo ao pautar derrubada do IOF e rejeita reunião para discutir decisão
Integrantes do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), parlamentares da oposição e até mesmo aliados do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmam terem sido pegos de surpresa com a decisão de Motta de pautar o PDL (projeto de decreto legislativo) que derruba o novo decreto do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), publicado pelo Executivo no início do mês.
Segundo relatos de dois líderes governistas e um auxiliar de Lula, ninguém do governo foi informado antes sobre a decisão de Motta —eles souberam pela publicação no X, antigo Twitter, do presidente da Câmara na noite desta terça-feira (24). Motta afirmou que o tema seria levado ao plenário nesta quarta-feira (25).
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), tinha se reunido na terça com Motta e não foi comunicado dessa decisão. Nem mesmo a ministra Gleisi Hoffmann (Secretaria de Relações Institucionais), responsável pela articulação política do governo com o Congresso, foi avisada.
Na manhã desta quarta, Gleisi convocou reunião no Palácio do Planalto com líderes da base aliada para discutir o tema. De acordo com relatos, a ministra queria entender dos líderes qual será o encaminhamento de cada partido na votação do tema.
A Folha apurou que ao menos três líderes pediram a Motta que ele convocasse uma reunião com as lideranças da Câmara nesta quarta antes da sessão do plenário para discutir o tema e teriam ouvido do presidente da Casa que isso não ocorreria.
Segundo relatos de dois participantes da reunião no Planalto, o clima era de surpresa com a decisão de Motta. Nas palavras de um deles, todos estão sem entender o que houve, se ocorreu alguma questão específica com o presidente da Câmara ou se isso representa mais uma demonstração da insatisfação dos parlamentares com o governo federal.
A líderes aliados, Motta relatou sentimento de que o governo quer desgastar o Congresso e a decisão de pautar a projeto foi motivada por esse mal-estar. Ele citou ainda falas de integrantes do Executivo de que o Congresso seria gastador, e argumentou que pauta propostas de interesse de Lula.
Mais além, Motta afirmou a esses líderes que não se comprometeu a segurar o projeto, cuja urgência já estava aprovada, para julho.
Nas últimas semanas, cresceram as queixas da cúpula do Congresso com o Executivo, sobretudo pelo atraso no pagamento das emendas parlamentares, mas também pelo o que congressistas classificam como falta de cumprimento de acordos estabelecidos por parte do Planalto.
Há também reclamações de governistas sobre Motta sobre a mudança da pauta sem discussão prévia, já que os itens que seriam votados nesta semana foram divulgados na última quarta-feira (18) e não havia a previsão de analisar o PDL. Eles também se queixam que um tema dessa importância será discutido em sessão virtual, já que grande parte dos parlamentares não está em Brasília por conta das comemorações de São João.
De acordo com relatos, o presidente da Câmara tem relatado a aliados uma crescente pressão dos deputados para que ele adotasse tom mais duro com o Executivo. Ele também teria se queixado das comparações que deputados fazem dele e de seu antecessor no cargo, Arthur Lira (PP-AL).
Além disso, um interlocutor de Motta diz que também gerou contrariedade na cúpula da Câmara o discurso do Palácio do Planalto sobre a derrubada dos vetos presidenciais que beneficiou empresários do setor elétrico e elevou a conta de luz. Esse aliado do presidente da Casa diz que há uma avaliação entre os deputados de que o governo tenta jogar a culpa desse processo para o Congresso.
A estratégia, agora, de acordo com um governista, será fazer a disputa política em torno do tema, com o argumento de que o governo busca justiça social ao propor que os mais ricos e empresas poderosas paguem mais impostos para bancar políticas públicas (e que vem sendo usado por governistas nos últimos dias).
Na manhã desta quarta, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, se pronunciou nas redes sociais, afirmando que o decreto do IOF “corrige uma injustiça”. “O decreto do IOF corrige uma injustiça: combate a evasão de impostos dos mais ricos para equilibrar as contas públicas e garantir os direitos sociais dos trabalhadores”, escreveu.
O líder do MDB, Isnaldo Bulhões Jr. (AL), apoiou a decisão de Motta em publicação nas redes sociais —ele é um dos principais aliados do presidente da Câmara. O emedebista também escreveu que está na pauta de votações uma MP (medida provisória) do governo federal que permitirá a venda de petróleo excedente da União em áreas já licitadas, com estimativas de arrecadação de R$ 20 bilhões neste ano.
“O presidente Hugo Mota publicou a pauta da sessão da Câmara dos Deputados desta quarta-feira. Votaremos o PDL que susta o decreto que aumentou o IOF e uma importante medida que ajuda a equilibrar a arrecadação do governo e aumenta o investimento em habitação popular, a MP 1291, que permite ao governo leiloar óleo e gás excedente. O que isso significa???? Mais arrecadação com menos impostos!!”, escreveu Isnaldo.
Um governista diz que chamou atenção o posicionamento do líder do MDB, já que ele é aliado do Executivo e considerado um dos principais interlocutores de Haddad no Parlamento. Bulhões e o ministro conversaram por cerca de 30 minutos por telefone nesta quarta, segundo apurou a reportagem.
Folha/UOL
Foto: Lula Marques/Agência Brasil