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Justiça, preconceito e o funkeiro algemado

Por Redação

A soltura de MC Poze do Rodo pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro não é apenas uma reviravolta jurídica. É um espelho incômodo do modo como o Estado — especialmente suas forças policiais — trata artistas vindos da periferia. Quando um cantor é preso por suas letras, e não por atos comprovados, o que está em julgamento não é o crime, mas a cultura.

O funkeiro foi detido em casa, sem camisa, algemado, e exposto nas redes sociais da Polícia Civil como se fosse troféu. A imagem viralizou com a legenda “RODOU” — linguagem que combina mais com redes sociais do que com o decoro de uma instituição pública. O desembargador responsável pela soltura foi claro ao classificar a prisão como desnecessária e a exposição como despropositada. E, mais do que isso, apontou falhas no próprio procedimento policial.

A acusação que pesa sobre Poze envolve apologia ao crime, com base em suas músicas e nos locais onde se apresenta. Não há flagrante, nem arma, nem droga. Há letras de funk, gravações de shows e o julgamento de um estilo de vida que incomoda setores da sociedade. Incomoda porque é periférico, barulhento e popular.

Não se trata de defender o conteúdo das músicas. Trata-se de defender o princípio constitucional da liberdade de expressão. E mais: o direito à dignidade, à presunção de inocência e à igualdade de tratamento diante da lei. Esses direitos valem para todos, inclusive para um jovem negro e pobre que canta para sobreviver.

A criminalização do funk, do rap, do samba — como já aconteceu antes — é uma constante no Brasil. Artistas dessas cenas são, muitas vezes, vistos antes como suspeitos do que como cidadãos. É um reflexo de um país que ainda escolhe quem pode ter voz e quem deve ser silenciado.

Ao revogar a prisão, a Justiça fez o que se espera de um Estado democrático: impôs limites ao arbítrio e lembrou que o devido processo legal ainda deve prevalecer. A pergunta que fica é: até quando será preciso lembrar disso?

Fonte: Instagram/Poze do Rodo

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