ColunasGisa Veiga

Deixem minhas matrioskas em paz

Eu sempre rejeitei patrulhas. De qualquer lado, de qualquer espécie. Não me exijam coerência o tempo todo. Prefiro ser uma metamorfose ambulante, desde que seja para meu aprimoramento como ser humano.

Também sou contra cancelamentos generalizados, normalmente surgidos sem uma rigorosa percepção da realidade do fato. Esses costumam ser estúpidos, cruéis, burros.

Sou contra a Rússia nessa perversa guerra contra a Ucrânia. Sou contra Putin. Mas não sou contra todos os russos. Até porque Putin não goza de unanimidade em seu país. Há russos em oposição ao seu presidente-ditador, que prende qualquer um que chamar a guerra de guerra. Assim como há brasileiros anti-bolsonaristas.

Eu gostaria de cancelar Bolsonaro como presidente da República, porque ele cancela artistas, intelectuais, a cultura, o bom senso, o bom gosto, o raciocínio lógico, a ciência, a empatia, o respeito etc. Mas não cancelo os meus amigos e parentes bolsonaristas.

Li na Folha de S. Paulo que restaurantes paulistanos estariam cancelando de seus cardápios pratos de origem russa – estrogonofe, por exemplo. E, em outro veículo que agora não me recordo, que um curso numa universidade brasileira cancelou estudos sobre Dostoievski. Grande tolice!

A cultura russa está sendo cancelada sem qualquer discussão aprofundada, sem um exame acurado dos fatos, das situações, das pessoas envolvidas. Bailarinos brasileiros, no auge de suas carreiras, são levados a deixar grandes companhias russas por causa da guerra. É irracional!

No podcast Expresso Ilustrada, Irineu Franco Perpétuo, tradutor e autor do livro “Como ler os russos”, lembrou como a Rússia influenciou a cultura brasileira. “Você não entende Villa-Lobos sem a música de Stravinski, nem entende Nelson Rodrigues sem o teatro de Dostoievski”, raciocina Perpétuo.

Pois é. Eu tento fazer uma coleção de matrioskas. Acho-as lindas! Sempre dependo de alguém que vai a Rússia passear para encomendar algumas. E vou continuar tentando montar uma coleção dessas maravilhosas bonequinhas.

Nem tentem me patrulhar. Deixem minhas matrioskas em paz!

 

 

 

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