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Um novo mito para chamar de seu

A ultradireita brasileira já tem um novo mito pra chamar de seu: Elon Musk. Ok, não é candidato a presidente do Brasil, mas já está inspirando pretendentes ao cargo, com certeza. Porque o eleitorado bolsonarista já o elegeu como o grande “garoto propaganda” do futuro candidato do grupo, seja ele quem for.

Musk não tem uma vida regrada como um “homem de bem”, não esconde que é usuário de drogas, não encarna o “homem de família”, não é cristão, mas, ah, que importa? Os bolsonaristas não estão mais defendendo isso. O importante é que ele defende censura, obscurantismo, tem aura de déspota. Tipo vilão, boca de meia-lua invertida, sempre carrancudo, disposto à briga. É disso que esse povo gosta.

Que bem ele pode trazer ao Brasil? Sempre me questiono sobre o que se passa pela cabeça de seus fãs em relação a isso, que já são chamados jocosamente de “elonminions”, esses seres que cultuam um malvado favorito – e quanto mais malvado, mais querido; quanto pior, melhor.

Ah! E o riquinho também gosta da China, sabiam? O bilionário fez uma rápida viagem ao país comunista para defender interesses de sua empresa Tesla. Mas, oh, logo a China? Cuidado, elonminions, ele pode ser simpático ao comunismo, como vocês pensam de qualquer um que faça negócios com aquele país.

Impressionante como os políticos perdem tempo defendendo ou atacando o bilionário, que está pouco se lixando para o Brasil. Na Câmara dos Deputados, parlamentares da oposição atacam o que chama de censura do ministro Alexandre de Moraes, do STF, em relação a perfis de usuários da plataforma que dissemina fake news, um dos principais combustíveis das campanhas de extrema direita. Esquecem que vários perfis do X – inclusive o meu – foram bloqueados sem um motivo que embasasse tal ato de censura. Eu, por exemplo, não uso palavrões, não faço discursos de ódio contra quem os faz, praticamente não uso o ex-Twitter para nada e, mesmo assim, fui bloqueada. Por quê? Acredito que pelo simples fato de que no meu perfil consta minha profissão de jornalista, que o Musk simplesmente odeia.

Os deputados da base governista contra-atacam e classificam a intromissão do bilionário nos assuntos internos do país como uma afronta à soberania nacional e defendem a votação do Projeto de Lei 2630/20 para regular as plataformas das redes sociais.

Eu sempre fui contra a regulação da imprensa nacional, que sempre me cheirou à censura. A imprensa profissional já paga um preço alto se for flagrada com notícias inverídicas. Ela já é regulada por leis, não precisa de mais regulação. Recentemente, mais uma norma: se um entrevistado falar alguma fake news, o veículo será punido. Então, reparem no tratamento diferenciado: a imprensa responde na Justiça, pode pagar multa alta e, enquanto isso, as redes sociais continuam terra de ninguém, onde tudo ou quase tudo pode, onde fake news continuam sendo disparadas largamente, e quando essas plataformas são chamadas para retirarem o conteúdo reclamam de censura.

As mesmas regras que são impostas aos veículos formais de imprensa devem, sim, ser aplicadas às redes sociais. Se a própria imprensa tem a liberdade de expressão vigiada, já que não se trata de um direito absoluto, por que não as redes sociais, que hoje têm um alcance extraordinário?

De mito em mito, o país se embrulha num terrível pacote de más referências. Afinal, o que é ser um homem de bem, hoje em dia? Alguém como Elon Musk?

 

Por Gisa Veiga

Artigo publicado originalmente no Jornal A União

 

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