Folha conversou com líderes evangélicos que apoiaram Bolsonaro naquele ano e em 2022, inclusive indo em reuniões com o então chefe do Executivo e o convidando para seus púlpitos. O sentimento mudou.

Nas palavras de um deles, as medidas autorizadas por Alexandre de Moraes, que podem implicá-lo numa trama golpista que incluía prender o próprio ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e convocar novas eleições que invalidariam a vitória de Lula, complicam efetivamente a situação de Bolsonaro ante essa liderança cristã.

Um grupo de WhatsApp que reúne vários desses pastores graúdos, o Aliança, continuava em silêncio sobre a operação policial horas depois de agentes apreenderem o passaporte de Bolsonaro. Em conversas privadas, um ou outro trocavam impressões, pedindo orações para o nome que endossaram com entusiasmo no pleito do ano retrasado.

Falar abertamente ninguém quer, com exceção do pastor Silas Malafaia, o único da turma que continuou ao lado do ex-presidente após a derrota nas urnas e consecutivos reveses judiciais. À Folha Malafaia chamou os colegas de “um bando de covardes e cagões históricos”.

O líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo contou ainda que outros pastores têm evitado responder falas suas criticando Moraes. Especula que seja por temerem uma associação com ele, que enxergariam como um alvo em potencial da Justiça.

“Você sabia que, de um ano pra cá, desde que venho botando pra derreter o Alexandre, várias lideranças não respondem mais vídeos que posto, com medo de eu ser preso e pegarem meu celular?”

Malafaia diz ainda que em 2022 aconselhou Bolsonaro a invocar o artigo 142 da Constituição, que trata do papel das Forças Armadas na República. Bolsonaristas defendiam que esse trecho da Carta dá respaldo para uma eventual intervenção militar, tese já rejeitada por STF, instituições como a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e boa parte dos parlamentares, mesmo muitos que comungavam com o bolsonarismo.

O pastor também define como “estúpido e esdrúxulo o que Moraes vem dizendo o tempo todo” e diz que, se prezasse pela transparência, o ministro nem sequer deveria ter presidido o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) durante a eleição, “porque foi secretário de Segurança de Alckmin, candidato a vice numa chapa”.

O hoje ministro do STF foi nomeado à secretaria por Geraldo Alckmin, então governador paulista e agora vice-presidente de Lula, em 2015.

Malafaia, contudo, tem sido cada vez mais voz isolada em seu segmento religioso. Na ala dos pastores que se posicionaram publicamente em 2022, muitos ainda reservavam críticas a Lula, como ao condenar declarações do petista que, em vez de pacificar o país, colocariam mais lenha na polarização nacional. Mas já vinham ensaiando uma trégua, com elogios à economia sob a batuta lulista, por exemplo.

Portais voltados ao público evangélico, como o Pleno News, deram destaque à operação contra Bolsonaro. O tom é mais simpático ao ex-presidente.

A bancada evangélica, que empossou na quarta (7) um aliado de Bolsonaro em sua liderança, o deputado Eli Borges (PL-TO), ainda não se pronunciou. Internamente, integrantes avaliam que um posicionamento pró-Bolsonaro pode ser temeroso, já que boa parte do bloco é composta por representantes de partidos de centro que se alinharam ao governo Lula.

Já Borges diz à reportagem que, “no momento certo”, a frente deve se manifestar. “Vou tomar mais pé da situação.”

Para o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), ex-presidente da bancada, Moraes está em busca “da cereja do bolo, que é a prisão do Bolsonaro”. Membro da igreja de Malafaia, o parlamentar diz que operações como a desta quinta são vistas nas igrejas como perseguição, “e isso só fortalece” o ex-presidente.

Uma pastora que se posicionou a favor do investigado foi a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que integrou a Esplanada bolsonarista. Pela manhã, disse que “não há outro sentimento que não seja o de indignação” com os desdobramentos judiciais e pediu: “Que Deus tenha misericórdia do nosso país”.