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MATÉRIA ESPECIAL: TRE-PB reconheceu, de 2020 a 2023, 22 fraudes à cota de gênero

A lei na cota de gênero tem o objetivo de aumentar a participação feminina na política fazendo com que os partidos incluam, ao menos, 30% de mulheres na disputa das eleições proporcionais. No entanto, na tentativa de burlar a lei, as legendas têm usado mulheres como laranja apenas para atingir o percentual, e o que deveria trazer igualdade tem escancarado o quanto o machismo ainda é presente. (via Jornal A União)

De acordo com a procuradora Regional Eleitoral, Acássia Suassuna, de dezembro de 2020 a abril de 2023, foram reconhecidos 22 casos de fraude à cota de gênero pelo Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba (TRE-PB), sendo um referente às eleições 2018 e 21 às eleições de 2020.

“É importante salientar que existiram vários outros processos em que foi imputada a fraude. Entretanto, em outros casos não ficou comprovado. Inclusive acatando o próprio parecer ministerial o TRE julgou improcedente. Não saberia dizer quantos processos de fraude de gênero nós tivemos ao todo”, disse.

Na opinião da procuradora,  a legislação  traz todo um aparato de normas para que as mulheres possam ter oportunidade e aprendizado na política. No entanto, é o descumprimento das normas que tem ocasionado o resultado contrário,  “É um número considerado elevado porque infelizmente quando nós falamos que a lei de cota de gênero ela é uma lei de 2009, nós temos aí 14 anos e que infelizmente ainda não conseguimos fazer com que ela seja real, efetiva. Mas que muitas vezes ainda se utiliza a figura da candidatura fictícia”, comentou.

Segundo a lei, quando cada partido for registrar seus candidatos para as eleições proporcionais, 30% precisa ser do sexo feminino. No entanto, Acássia Suassuna explica que não basta apenas realizar a candidatura, é necessário ter um interesse real das mulheres em participar do pleito. Caso contrário, é configurada a fraude.

“A fraude é uma afronta ao princípio da isonomia, cidadania e do pluralismo político. Nós queremos uma verdadeira democracia com isonomia real entre homens e mulheres. Para isso, precisamos de candidaturas femininas de verdade”, alertou a procuradora.

As evidências de fraude só são possíveis de serem analisadas após o fim do pleito. Entre as principais, já reconhecidas pelo Tribunal Superior Eleitoral como determinantes, estão: votação zerada ou inexpressiva; ausência de movimentação de recursos na campanha, não prestação de contas ou prestação de contas “zerada”; não participação em atos de campanha, nem na internet (redes sociais); parentesco com outros candidatos para o mesmo cargo e desinteresse da candidata na corrida eleitoral.

“Nas eleições de 2020 ficou evidente a falta de participação na campanha. Quase toda a campanha foi feita por rede social, em razão da pandemia. E vimos candidatas sem uma postagem. Ela não fez nenhum jingle, ela não pediu voto”, comentou Acássia.

A lei também prevê incentivos econômicos para a participação das mulheres, a exemplo de estabelecer 5% do Fundo Partidário apenas para criação de promoção e difusão de programas para as candidaturas femininas; 30% do Fundo Especial de financiamento de campanha e 30% do montante do fundo partidário utilizado para campanha.

Para Acássia Suassuna, a falta de incentivo é fruto de um machismo estrutural.  “Ainda há uma falta de interesse dos partidos em promover a participação feminina. Eles tem vários instrumentos como a lei ela já destaca. Ou seja, a norma traz incentivos econômicos para que os partidos promovam as mulheres. Entretanto, eles não estão cumprindo isso e, consequentemente, não despertam nas mulheres o interesse em participar do pleito. Porque, na minha opinião, ainda vivemos um machismo estrutural”, afirmou.

 

Números

Os números evidenciam essa realidade. Nas Eleições de 2020, apenas uma mulher foi eleita para a Câmara de Vereadores de João Pessoa. Já na Assembleia Legislativa da Paraíba, seis mulheres conseguiram uma das 36 vagas, durante as Eleições 2022.

De acordo com uma pesquisa realizada pela Ong Elas no Poder, em 2020, a maioria das mulheres, cerca de 40%, acha que não tem perfil para a política. Segundo observação da Ong, esse é um dado preocupante, tendo em vista que a política é um espaço para os mais diversos perfis e personalidades.

O que mais incentiva o gênero feminino a enfrentar os preconceitos e desafios na política tem sido as próprias convicções pessoais. Cerca de 53% das que pretendem se candidatar em algum momento afirmaram que  foram incentivadas por uma vontade própria  Esse dado está de acordo com os estudos internacionais sobre as motivações das mulheres em se candidatar.

Os estudos mostram que os incentivos sociais servem como um dos fatores mais fortes de predição da ambição política entre as mulheres, mas que mulheres e meninas recebem, ao longo de sua vida, menos incentivos que os homens. Além disso, é possível notar a preferência por cargos do Legislativo, especialmente municipais. Isso pode ser explicado pelo fato dessas disputas, de forma geral, precisarem de menos votos, o que torna a decisão de se candidatar mais palpável.

 

Punições para Fraude de gênero

 Segundo explicou a procuradora eleitoral, quando acontece a fraude, a primeira coisa a ser feita é tornar o documento apresentado pelos candidatos, o Demonstrativos de Regularidade e Atos Partidários (DRAP) sem efeito, já que foi apresentado algo que não é real. Consequentemente, todos os candidatos que foram eleitos daquele grupo do DRAP são cassados e podem se tornar  inelegíveis em até oito anos aqueles que participaram efetivamente da fraude.

 

Alertas para partidos nas Eleições 2024

Com a proximidade das Eleições 2024, a procuradora fez um alerta aos partidos em relação à fraude à cota de gênero. Ela observou que o reconhecimento do crime tem sido feito pela Justiça Eleitoral não apenas na Paraíba, mas em todo o país. “Esses julgamentos têm uma mensagem clara para os partidos que não adianta colocar candidatura fictícia naquela lista se no decorrer da campanha você evidenciar os elementos da fraude. Ou seja, partido, cumpra a lei e realmente só insira na lista mulheres que tenham interesse no pleito. Porque se não fizerem assim a no decorrer da campanha a fraude será evidenciada e todos os que estiverem na lista vão ser prejudicados”, enfatizou.

A procuradora acrescentou ressaltando a importância dos partidos irem além do cumprimento da lei e incentivarem as candidaturas femininas. “Partidos, cumpram integralmente o que diz a legislação quando ela determina que no estatuto do partido tem que existir normas de prevenção a qualquer tipo de discriminação da mulher, qualquer violência política de gênero. [..] Assim a mulher vai se sentir apoiada e será despertado o interesse. Quando isso acontecer, aí sim teremos mulheres com real vontade de participar do pleito”, disse.

Matéria assinada por Iluska Cavalcante

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