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ESPECIAL ADOÇÃO: Cursos preparam pretendentes para ato de amor

No dia 25 de maio é celebrado o dia nacional da adoção, instituída no Brasil pela Lei Federal nº 10.447, de 9 de maio de 2002.  A data busca estimular o desenvolvimento de ações e campanhas em todas as searas, com o intuito de desmistificar e incentivar a adoção e promover ampla discussão e naturalização do tema. (via Jornal A União)

Com isso, a Vara da Infância e da Juventude de Patos realiza nos dias 24 e 25 de maio, no auditório do Fórum Miguel Satyro, o Curso Preparatório para Pretendentes à Adoção. A capacitação é uma etapa obrigatória, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente é realizado uma vez por ano e tem a carga horária de 16h.

Nos dois dias de encontro a Equipe Multidisciplinar do Núcleo de Apoio da Equipe Multidisciplinar do Tribunal de Justiça da Paraíba (Napem) formada por três assistentes sociais, dois psicólogos e uma pedagoga, vai esclarecer todos os aspectos que norteiam a adoção para cerca de 25 inscritos, entre casais e solteiros, das 55 cidades da 3ª Circunscrição que desejam se habilitar para adotar uma criança ou adolescente.

“A finalidade do curso é conhecer a equipe e dar algumas explicações sobre a adoção, um dos mais carregados de mitos. São formações em relação como é adotar um filho, a pretensão de adotar, em relação as expectativas dessas pessoas que querem adotar, aos desafios, as questões psicológica, socias e pedagógicas no processo de adoção, tanto na questão dos pretendentes  como em relação ao filho que vai chegar,” esclareceu a Assistente Social do Napem, Jaira Alana Claro Pereira e Lacerda.

Segundo a equipe do Napem, é importante que se fale sobre adoção para os candidatos com transparência, sem romantismos e mitos. Os postulantes têm que saber que as crianças e os adolescentes disponibilizados para adoção passaram por ruptura de vínculos, foram abandonados e carregam cicatrizes emocionais e traumas. Muitos têm prejuízos cognitivos e emocionais, além de deficiências físicas e mentais. A transparência deve alcançar, inclusive, a forma de lidar com o passado da criança.

“As crianças não podem ter sua história apagada; pelo contrário, devem ter a oportunidade de reescrevê-la por meio do afeto, da proteção e do pertencimento familiar”, ressaltou a pedagoga do Napem, Talita Medeiros de Araújo.

De acordo com o artigo 43 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a adoção só será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos. As razões que levam uma pessoa a buscar a adoção são as mais variadas, mas em todos os casos devem estar enraizadas e legitimadas em motivações éticas, justas e verdadeiras, que preservem o superior interesse da criança ou adolescente.

Apesar da maioria dos pretendentes trazerem dentro de si um enorme desejo de se tornarem pais, muitas vezes, eles não têm claro o que é a adoção no seu conceito mais subjetivo, conforme avaliou a equipe do Napem.

“Independentemente dos motivos que levam os casais à Justiça Infantojuvenil para transformarem em filho uma criança ou adolescente com o qual não têm qualquer laço biológico, eles devem estar voltados para o afeto, o respeito e o sentimento de filiação definitiva e de proteção”.

Após essa capacitação, uma equipe de psicólogos entrevista o candidato para avaliar se ele tem capacidade afetiva de acolher, sem ressalvas, uma criança ou adolescente. Na avaliação psicossocial, não há qualquer critério diferenciador em razão de gênero, orientação sexual, religião ou status socioeconômico, entre outros.

Para um candidato ser habilitado e inserido no cadastro de adoção, o sistema de justiça deve estar convencido de que ele reúne condições de acolher e favorecer a criança ou adolescente de maneira prioritária, pela estrutura emocional, protetiva e financeira que oferece, sendo capaz de suprir as necessidades fundamentais do adotando.

Jaira Alana enfatizou que a adoção é um instituto de natureza irrevogável e que após a sentença proferida pelo magistrado, deflagra consequências jurídicas e emocionais eternas na vida de todos os envolvidos, transformando a criança ou adolescente em filho, com todos os direitos e deveres, para sempre. Entretanto, existem casos em que alguns postulantes tentam interpretá-la como uma espécie de “teste drive”, com o pensamento de que, se não der certo, devolve o filho. O que a lei garante é o estágio de convivência antes da adoção, para que seja possível avaliar a conveniência da constituição do vínculo definitivo – artigo 46 do ECA

“A adoção é irrevogável, nem a criança pode deixar de ser filha dos pais, nem os pais podem desistirem e deixarem de ser pais dessas crianças. Uma vez que, finalizado o processo de adoção, no Registro de Nascimento daquela criança vai ser retirado o nome dos pais biológicos e colocado o nome dos futuros pais. Inclusive, dependendo até da idade da criança, eles (pais pretendentes) podem até mudar o nome da criança,” esclareceu.

A formação contará, também, com a participação de profissionais da Casa de Acolhimento da Comarca de Patos, da Secretária de Desenvolvimento Social do Município, de pessoas que participam do Projeto Família Acolhedora e da promotora de Justiça, Larissa de França Campos.

 

Desafios

Um dos grandes desafios do Judiciário hoje é equacionar as inúmeras variáveis que podem atrasar um processo de adoção como um todo. Essas variáveis transitam entre a demora no desembaraço da situação jurídica das crianças e dos adolescentes – quer seja para reintegrá-los à família de origem, quer seja para cadastrá-los à adoção – principalmente porque a preferência dos pretendentes é por meninas, com até dois anos de idade, sem doenças graves nem irmãos.

As crianças mais velhas e adolescentes, entre os três e os 18 anos de idade, continuam sendo pouco aceitos pelos postulantes à adoção, embora, a “adoção tardia” venha ganhado adeptos pouco a pouco. Segundo Talita Medeiros para esse perfil o processo de adoção seria finalizado bem mais rápido. A pedagoga ilustrou que no curso de preparação, procura-se mostrar às famílias que também é possível estabelecer vínculos fortes com eles.

“Não necessariamente para a gente ser mãe ou ser pai precisamos ser mãe de bebê. Claro que tem todo aquele rito de ter um filho, de criar desde pequeno. O que é importante é na adoção é a questão do vínculo materno, paterno e filial, enfim, a composição familiar,” abordou.

Mas a idade não é o único obstáculo para a adoção. Crianças com enfermidades e pertencentes a grupos de irmãos também têm dificuldade em serem adotadas. Na hora de definir o perfil da criança, o habilitado pode ainda fazer restrições quanto à cor e ao sexo. Portanto, a angústia da espera tem dois lados: o da família que deseja adotar e o da criança que aguarda uma família que a aceite como ela é.

A pedagoga também esclareceu que o trabalho do Napem não é persuadir os casais a mudarem de perfil, mas orientá-los quanto à realidade das crianças e dos adolescentes que estão nas entidades de acolhimento.

No Brasil, 3.770 crianças e adolescentes estão aptos para adoção. Do outro, 46.390 pretendentes cadastrados, segundo dados de 2021, do Conselho Nacional de Justiça. Em relação à idade, os dados do CNJ mostram que 279 crianças disponíveis para adoção têm até dois anos. Mais de 2,6 mil têm oito anos ou mais, sendo que a principal faixa é dos adolescentes com mais de 16 anos, 742.

No caso da etnia, 54,1% dos que aguardam por uma família são pardos, 27,3% são brancos, 16,8% são pretos e 0,8% não tiveram a etnia informada. Os números do CNJ ainda apontam que 17,6% do total enfrentam problemas de saúde e 17,4% possuem algum tipo de deficiência. Além disso, mais da metade das crianças e adolescentes tem irmãos.

Atualmente, em Patos há oito pretendentes cadastrados, uma criança e um adolescente na casa do acolhimento aptos para adoção.

“Mas isso não quer dizer que essas crianças serão, obrigatoriamente, adotadas por pessoas de Patos. Elas também podem ser adotadas por pessoas de outras cidades do Estado e do Brasil, vai depender da ligação entre o perfil da criança e do perfil da que a pessoa deseja,” explicou a Assistente Social do Napem, Jaira Alana Claro Pereira e Lacerda.

Desejo e realidade

Identificar as legítimas razões que levam as pessoas a buscarem a adoção não é tarefa simples. Existem casais que buscam a adoção porque deixam para se casar mais tarde e acabam se deparando com problemas de infertilidade e outros que deseja muito engravidar, mas descobre que não pode fazer isso naturalmente devido problemas de saúde. Dados da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva, divulgados pela Sociedade Brasileira de Urologia, apontam que um casal é considerado infértil se, após um ano de tentativas sem o uso de nenhum método anticoncepcional, não consegue engravidar.

Foi o que aconteceu com o casal de servidor público, ítalo de Andrade Gomes e Mayllanne Medeiros de Araújo. Em 2018 eles descobriram que tinham a mínima chance de ter filhos de forma natural, devido a uma dificuldade clinica no esposo. Sendo assim, diante do diagnóstico, o casal partiu para adoção em busca do sonho, desejo de ser mãe, pai, de construir e aumentar a família e em maio de 2019 deram entrada no processo de habilitação para adoção.

Antes de serem inseridos no cadastro de habilitados para adoção, ítalo e Mayllane passaram por todos os trâmites necessários: a Vara da Infância e da Juventude de Patos para ingressar com a ação, participaram do Curso Preparatório para Pretendentes à Adoção e se submeteram ao estudo psicossocial.

Paralelo, o casal continuou com tratamento e as tentativas, mas aquilo que parecia quase impossível para a medicina, mas não para Deus, aconteceu e em novembro de 2019, Mayllane engravidou da primeira filha biológica, Lis de Andrade Gomes.

“As chances eram mínimas na visão médica, mais que conseguimos, com a graça de Deus e estamos com nossa pequena,” enfatizou Mayllanne Medeiros de Araújo.

Mesmo com a chegada da filha biológica, o casal seguiu com a pretensão de adotar, renovaram o cadastro e continuaram na espera. “Em nenhum momento pensamos em desistir, mesmo depois da nossa filha biológica,” disse Mayllanne.

Neste ano e após três anos na fila da adoção, ela e o marido receberam um telefonema do Juizado da Infância lhes informando que havia uma criança para apta para adoção e que eles eram o casal da vez.

“Nós aceitamos de imediato e nos colocamos a disposição dos trâmites que a justiça exigisse, assim fizemos e hoje estamos com a guarda do nosso filho e muito felizes,” frisou Mayllanne.

Davi de Andrade Gomes tinha poucos dias de vida quando entrou na vida do casal, trouxe muita alegria e mudou totalmente a rotina de toda a família

“Na verdade, fomos nós os agraciados com tamanho presente de Deus dois filhos. Foi Ele (Deus) mostrando a Sua misericórdia e o Seu amor e nos permitiu viver a graça de duas formas. Então nós nos sentimos completos, realmente abençoados e realmente impulsiono todos aqueles que tenham o desejo no seu coração que possam maturar essa ideia (adoção) porque, apesar dos desafios, é realmente maravilhoso,” finalizou Mayllanne Medeiros de Araújo.

O advogado, José Corcino Peixoto Neto e a psicopedagoga, Elisangela Torres Corcino também vive a experiência da adoção. João Victor Torres Corcino veio em 2013, com quase nove meses, por entrega voluntária prevista no art. 19-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), doente e bastante debilitado.

“A mãe que o gerou manifestou interesse em entregá-lo e nos passou a guarda dele no cartório, que era permitido naquele tempo. Ele chegou com começo de pneumonia, ele estava com Giárdia e chorava muito. Mas ele nos conquistou, apesar do desafio, ele transformou as nossas vidas,” disse Elisangela.

Aos três anos de idade, o casal começou a perceber desenvolvimentos atípicos, déficits na comunicação e na interação social em João, levando em comparação a outras crianças com a mesma idade, sendo diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), moderado.

“A convivência foi mostrando que ele (João) era uma criança diferente, inevitavelmente, a gente fazia comparações entre João e uma afilhada minha da mesma idade. Foi aí que percebemos que ela se desenvolvia de uma forma e o João de outra. Ele veio falar a primeira palavra com um ano e quatro meses e com dificuldades. E só veio falar efetivamente com quatro anos. Também era muito repetitivo e estereotipados,” explicou Corcino Neto.

Em 2017, o casal ingressou com o processo de adoção, porém como já tinha mais de quatro anos de guarda de fato, com isso o processo foi mais rápido.

“Quando a gente entrou com o processo já tínhamos mais de quatro anos de guarda de fato, a lei exigia três e aí foi dispensado o período de convivência. Entretanto, agora é diferente, com o estatuto da criança e do adolescente a Lei mudou. Então algumas coisas, agente entrou na exceção que a Lei permitia e que hoje não é mais tão simples,” esclareceu o advogado.

Agora que João tem dez anos, os dois já fazem planos para aumentar a família.

“Estamos pretendendo adotar mais filhos. Posso afirmar-lhes, sem titubear: convivo com meu João há 10 anos, e ele já me absorveu, amorosamente, por completo. É toda a minha vida, é a minha razão de viver. Se vocês pudessem entrar no meu coração por um segundo, e viver o que estou vivendo, sentir o que estou sentindo, estariam todos, em algum momento, na fila de adoção,” finalizou Elisangela Torres Corcino.

Lusângela Azevêdo, do Jornal A União

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