ColunasGisa Veiga

Tempos de tempestade

A inspiração veio de um artigo do incrível Ruy Castro, na Folha de S. Paulo desta segunda-feira, 25: “Mitos difíceis de matar”. A base é a mesma: estórias contadas sem verossimilhança, mas que, de tão repetidas, acabam virando “verdade” para muitos.

Assim são as estórias contadas em bolhas na internet, especialmente facebook, whatsapp e twitter. Versões distorcidas de uma realidade, com aparência de verdade, ou apenas mentiras deslavadas, mesmo, engolidas sem esforço pelos incautos e repassadas freneticamente.

Vivemos tempos de tempestade, de ventos furiosos de contrainformação. Uma guerra sem tanques, mas com a força de um poderoso furacão. E a destruição é grande! Uma guerra que não necessariamente gera forme, mas uma perigosa indigência intelectual que cega o entendimento e promove o atraso.

Incrível como pessoas aparentemente inteligentes acreditam e compartilham essas estórias – políticas, principalmente – sem qualquer senso crítico. E tome fake news sobre vacinação, sobre STF, sobre políticos de todas as cores partidárias e ideológicas, sobre curas milagrosas de doenças e textos atribuídos ao Papa, a jornalistas, escritores e artistas famosos que jamais escreveram uma palavra sequer daqueles artigos.

Tome desinformação, vídeos com montagens até grosseiras e outras nem tanto, tome declarações jamais feitas por A ou B. E – o mais lamentável – tome incitação ao ódio.

Certo dia conversei com uma pessoa que me deixou estupefata. Chegou a declarar que se sentia mal vendo noticiários de TV ou sites (feitos por profissionais). Ficava deprimido. Talvez porque a verdade às vezes dói bastante. Decidiu desligar a TV e continuou se desinformando através da sua bolha na internet, recebendo seu pacotinho diário de mentiras com alfinetadas na imprensa tradicional – faz parte do plano de marketing desses grupos desacreditar o jornalismo profissional.

Eu fiquei boquiaberta com a ingenuidade daquele homem que já ocupou cargo público, com curso superior, profissional competente. Seria mesmo possível ele acreditar em tudo aquilo que dizia ou, ao contrário, seria uma bizarra forma de atrair seguidores à sua alucinação? Estaria ele apenas encenando?

Pior que não. Ele repetia frases e palavras de ordem típicas de certas bolhas, e ficava surpreso com as notícias verídicas, comprovadas, que eu lhe repassava enquanto conversávamos.

“Não pode ser verdade”, reagia.

“Mas é”, eu dizia.

“Só pode ser mais uma mentira da imprensa”, debatia-se.

“Não, não é”, eu atalhava, explicando tudo tim tim por tim tim.

O que leva uma pessoa a enjeitar a imprensa e adotar o whatsapp como fonte de “informação”? Como jornalista, fico triste com a – muitas vezes – injusta fama. Fico me perguntando como, num mundo globalizado, com a avançada tecnologia da informação, a desinformação superou os fatos. E assusta-me a força da mentira, das palavras irresponsáveis que solapam o entendimento, chamuscam o discernimento e dissolvem a autocrítica.

Já dizia Victor Hugo: “As palavras têm a leveza do vento e a força da tempestade”.

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